Ecologia e Conservação de grandes felinos do Alto Rio Paraná – MS/SP

Alto Rio Paraná

A região do Alto Rio Paraná encontra-se dentro do Bioma Mata Atlântica, na ecorregião denominada Florestas do Alto Paraná. Mas é uma área de transição entre a Mata Atlântica e o Cerrado. Apresenta um mosaico de vegetação natural, com campos de várzeas, mata semidecídua, cerrado e matas ripárias, além das áreas utilizadas pela agropecuária.

O Alto Rio Paraná estende-se por cerca de 480 km, da confluência dos rios Paranaíba e Grande em Minas Gerais até os Saltos de Sete Quedas, hoje submersos pelo reservatório da hidrelétrica de Itaipu. Demarca a divisa do estado do Mato Grosso do Sul com São Paulo e Paraná. Com o enchimento do reservatório da hidrelétrica de Porto Primavera (Sérgio Motta) em 1998, cerca de metade de sua extensão foi alagada, restando hoje apenas 30% do leito do rio Paraná livre de barragens no Brasil, conservando ainda as características de planície aluvial com sua rica biodiversidade.

Unidades de conservação, como o Parque Estadual das Várzeas do Rio Ivinhema (MS) e Parque Nacional de Ilha Grande (PR), foram criados para proteger este ambiente único, na sua maior parte constituído por várzeas. Apesar de haver forte influência antrópica da agropecuária sobre estas áreas, ainda há populações residentes de grandes mamíferos, como a anta (Tapirus terrestris); cervo-do-pantanal (Blastocerus dichotomus); cateto (Tayassu pecari); queixada (Pecari tajacu); capivara (Hydrochoerus hydrochaeris) e os grandes felinos: onça-pintada (Panthera onca) e onça-parda (Puma concolor).

Histórico de pesquisa

Entre 1992 e 1994 o pesquisador Peter Crawshaw iniciou os estudos com grandes felinos na região, em virtude do enchimento do reservatório de Porto Primavera. Em 1998 os estudos foram retomados por equipe do Instituto Pró- Carnívoros (IPC), avaliando o impacto do enchimento nas populações de grandes felinos, além do manejo e conservação das espécies na região. Paralelamente o IPÊ (Instituto de Pesquisas Ecológicas) iniciava estudos sobre a onça-pintada no Parque Estadual do Morro do Diabo (SP), no Pontal do Paranapanema, próximo ao Rio Paraná. Em 1999, em uma reunião de especialistas em onça-pintada, a região foi indicada como uma das áreas prioritárias para conservação da espécie, em toda sua distribuição.

Em 2002 o Pró-Carnívoros iniciou os estudos no Parque Estadual das Várzeas do Rio Ivinhema (MS) e a partir de 2004 trabalhamos em parceria com o IPÊ em toda região do Alto Paraná, unindo esforços na conservação das onças, deste ambiente singular e das espécies que ali habitam.

 

Porto Primavera

A represa da hidrelétrica de Porto Primavera inundou cerca de 2,250 Km² no Alto Rio Paraná entre 1998 e 2001. Como um dos condicionantes ambientais para o enchimento do reservatório, o trabalho de monitoramento de espécies ameaçadas, como o cervo-do-pantanal e a onça-pintada, foram financiados pela CESP (Companhia Energética de São Paulo), responsável pela hidrelétrica.
Entre 1998 e 2002 foram monitoradas com radiotelemetria convencional (VHF) seis onças-pintadas e três onças-pardas na área de influência de Porto Primavera.

As onças eram capturadas, procedendo-se a coleta de material biológico para análises genéticas e epidemiológicas, biometria e colocação de coleiras com rádios para o monitoramento.

O enchimento de Porto Primavera trouxe dois problemas para os grandes felinos, principalmente para onça-pintada. Além da diminuição de áreas adequadas para a ocorrência da espécie, aumentou o contato dos predadores com animais domésticos (gado).
As onças-pintadas ocupavam quase exclusivamente as várzeas e o enchimento inundou estas áreas, forçando os animais a se deslocarem para locais já ocupados pela pecuária e com poucos refúgios. Portanto houve um deslocamento maior na busca por alimento e refúgio além de um aumento na área de vida das onças. O contato maior com o gado e a diminuição da disponibilidade de presas naturais aumentou os casos de predação sobre o gado pela onça-pintada. Estas acabaram na sua maioria sendo mortas, em retaliação pelas perdas econômicas, acelerando a extinção local da onça-pintada. Registros ocasionais posteriores são possivelmente de animais passageiros que não se estabelecem pela falta de ambiente propício.

 

Parque Estadual das Várzeas do Rio Ivinhema

Como medida compensatória pelo enchimento de Porto Primavera a CESP adquiriu e repassou ao governo do estado do Mato Grosso do Sul a área do parque do Ivinhema. São 73.330 ha com  extensas várzeas do Rio Paraná e Ivinhema ainda preservadas. Cinco onças-pintadas e três onças-pardas foram capturadas e monitoradas com rádios VHF e com GPS na região do parque. O estudo mostrou que enquanto as pardas ocupam também as áreas mais altas, nas fazendas fora do parque, as pintadas usam quase exclusivamente as áreas de várzea no interior da unidade, demonstrando a importância deste ambiente e deste parque para a conservação da onça-pintada na região. Armadilhas fotográficas também foram usadas para estudos de densidade populacional de onça-pintada e interações entre predadores e presas. Resultados demonstram que há uma baixa densidade de onças-pintadas, porém a simpatria dos dois grandes felinos na área ocorre provavelmente em função da disponibilidade de presas.

Finalmente, em parceria com outras instituições e pesquisadores, utilizamos dados da onça-pintada na região para indicarmos áreas prioritárias para a conservação em todo Alto Paraná, no projeto PDA – Mata Atlântica, financiado pelo Ministério do Meio Ambiente.

 

Bibliografia

Agostinho, A. and Zalewski, M. 1996. A planície alagável do alto rio Paraná:
importância e preservação (Upper Paraná River Floodplain: Importance and preservation). Nupelia/EDUEM. Maringá, BR

Culen Jr., L., Abreu, C. K., Sana, D. e Nava, A. F. D. 2005. As onças-pintadas como detetives da paisagem no corredor do Alto Paraná, Brasil. Natureza e Conservação 3: 43-58.
Cullen Jr, L. 2006. Jaguar as Landscape Detectives for the Conservation of Atlantic Forests in Brazil, PhD dissertation. University of Kent, Canterbury, UK
Di Bitetti, M.S., Placci, G. and Dietz, L.A., 2003. Uma Visão de Biodiversidade
para a Ecorregião Florestas do Alto Paraná – Bioma Mata Atlântica: planejando a paisagem de conservação da biodiversidade e estabelecendo prioridades para ações de conservação. FundacionVida Silvestre Argentina/World Wildlife Fund. Washington, D.C. USA.

Fotos: Programa Onças do Alto Paraná (Figs:1,3,9,11,12,13) e Adriano Gambarini (Figs:5,6,7,8,10).
Programa Onças do Alto Paraná

Região de atuação

mata-atlantica

Equipe responsável

Coordenador do Projeto:

Biólogo Denis Alésio Sana

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